terça-feira, 15 de setembro de 2020

O Sete de Setembro em Ipameri

 

O Sete de Setembro em Ipameri

 

Não acontecia em um dia só, ou em uma semana.  Era um período que começava por volta de meados de agosto, e ia se intensificando nos treinamentos e preparativos até atingir uma certa perfeição e com um entusiasmo esfuziante e envolvente capaz de englobar cada cidadão, cada família e toda a cidade.

O 6* Batalhão de Caçadores ruflava seus tambores, ecoava seus clarinetes e seus soldados marchavam com passos tão firmes e sincronizados que o ruflar, os clarins e a batida firme dos pés contra o solo faziam a cidade tremer. Um tremor compassado, rítmico, firme, vibrante, cheio de um patriotismo contagiante, capaz de mexer com a gente e ir, dia a dia, enchendo as almas e os corações de um patriotismo vibrante, pujante, pleno de amor à pátria.

Um ufanismo intenso e crescente a cada dia.

O momento era de extravasar todo o amor à pátria.

A pátria era nossa, nosso lugar, rincão, refúgio. 

Pátria Amada Brasil.

Cada escola se preparava esmeradamente para o sonhado dia do desfile. Sete de Setembro, dia da Pátria, da Independência.

Em cada casa havia um movimento de preparação para que os jovens estivessem vestidos e calçados de acordo com o padrão da escola: Calças ou saias impecáveis, lavadinhas, passadinhas, costuradinhas, remendadinhas, sem faltar botões.

Tênis branquinho, novo ou recomposto com água, sabão e alvaiade.

Quem não fosse desfilar também deveria estar apresentável, de banho tomado, a melhor roupa, cabelos penteados; as mulheres empoadas e com uma pinturinha, algum adereço; pois afinal iriam ver alguém da família passar marchando em sua escola olhando para a frente, passo firme e certo, corpo ereto, peito estufado, exalando orgulho e patriotismo.

Cada escola tinha um padrão de mais ou menos luxo, mas todas se empenhavam ao máximo nos treinamentos que iam desde o mês de agosto até o Sete de Setembro que era a apoteose.

Na minha escola a gente treinava com tambores bem simplesinhos, quase que improvisados e um ou outro que se conseguia emprestado. Na fase de treinamento o importante era treinar o passo, manter o alinhamento de filas e colunas, observar a distância entre o que ia à nossa frente e a gente. Para treinar, a roupa era o uniforme quase sempre muito gasto, barras às vezes puídas, desbotado, singelo ao extremo. O calçado era o que tivesse, se tivesse.  Sapatos desgastados, botinas, pés descalços, um pé calçado outro não; tudo podia. As meninas costumavam ser mais arrumadinhas e cuidadosas. Já tinham lá sua vaidade e seus propósitos.

E lá íamos nós, em marcha treino pelas ruas. Nossa professora que era também diretora, orientadora pedagógica, chefe de disciplina e proprietária da escola;  queridíssima por nós todos; ia acompanhando e escolhendo as ruas de piso mais macio e sem espinhos, de forma que fossem apropriadas para todas as condições de pés desde os bem calçados, os semi-calçados, até os  totalmente descalços.

Todos patriotas de peitos arfantes e prontos para amar e defender o nosso Brasil, dia e noite, a qualquer preço.

Ainda antes que chegasse o dia do desfile, o Exército cedia um fragmento de sua portentosa banda e um sargento para dar os últimos retoques nas escolas. O comando firme, a presença tão ilustre, o tarol bem percutido, o tamborzão surdo, sacudindo nossos tímpanos à cada batida firme do soldado de farda verde: Tudo levava a gente a se sentir verdadeiros e heroicos guerreiros prontos a lutar pela pátria até à morte, frente a quaisquer inimigos.

Chegado o dia, depois de muita peleja, muitas ordens, chamadas à disciplina, exaltação ao brio, à necessidade de nossa escola fazer bonito; recomendações de mais e mais amor à Pátria: Finalmente estávamos em forma.

A banda reforçada por um empréstimo de outra escola e um soldado do exército.

Um Colégio com grandes bandeiras fora escolhido para abrir o desfile, depois viria um outro, depois o Grupo Escolar Estadual, depois o Ginásio Estadual com todo o seu orgulho e tradição, vigor e majestade; não sei se tinha mais alguma escola, mas finalmente chegava nossa vez e, depois de nós o Exército fechando imponentemente o desfie.

Tam... tam... tararam tamtam... tararam... tararam... Era nossa bandinha e nossa escola passando plap... plap...; plap... plap...;faziam nossos pés batendo contra o solo, Acerta o passo| Olha pra a frente! Um... dois... um... dois...!

E as palmas, merecidas ou não, ecoavam na medida em que íamos passando por nossa torcida. 

 É, tinha até torcida.

E quando finalmente o desfile acabava, os patriotinhas mirins e todo mundo, menos o Exército que tinha lá sua disciplina rígida, saíamos em desabalada carreira, impando de vaidade, de alegria, de liberdade e voávamos em direção às nossas casas, rindo, conversando, comentando e loucos para chegar em casa e ouvir os comentários a respeito do desfile, do desempenho das escolas e de nosso desempenho.

Ainda haveria de passar mais uma semana até que os arroubos de patriotismo fossem se acalmando, sem nunca se extinguirem, dentro de nós.

Viva nossa Independência! Viva o Sesquicentenário de nossa Ipameri!

Rilmar – 11/09/2020

 

 

3 comentários:

  1. Oh RJG,
    VC me fez chorar...Sete de Setembro era pra mim o dia mais importante do ano.
    Nem Natal nem ano novo, nem aniversário.
    Sete de Setembro era a GLÓRIAAAA. A banda do meu colégio (Marista, onde eu era bolsista paga por uma família católica de Guaxupé, que nunca conheci), era treinada por um Cabo da Banda dos Fuzileiros Navais do RJ. Era o máximo. Eu era o chefe dos pifaros. Éramos 28 e tocávamos 12 músicas, inclusive Colonel Bogey ( Ponte do Rio Kay) e Funiculi funicula. Preparavamos por um mês para a data.
    Qdo entrávamos no praça diante do palanque com as autoridades e trocávamos a marcha batida para asteamento da bandeira, eu quase morria de emoção.... VC me fez reviver esses momentos com seu lindo texto. Obrigado por VC existir e ser nosso colega...👏🙏🏼

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  2. Meu colega de turma de medicina na UnB - Dr Adnei

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  3. Oh RJG,
    VC me fez chorar...Sete de Setembro era pra mim o dia mais importante do ano.
    Nem Natal nem ano novo, nem aniversário.
    Sete de Setembro era a GLÓRIAAAA. A banda do meu colégio (Marista, onde eu era bolsista paga por uma família católica de Guaxupé, que nunca conheci), era treinada por um Cabo da Banda dos Fuzileiros Navais do RJ. Era o máximo. Eu era o chefe dos pifaros. Éramos 28 e tocávamos 12 músicas, inclusive Colonel Bogey ( Ponte do Rio Kay) e Funiculi funicula. Preparavamos por um mês para a data.
    Qdo entrávamos no praça diante do palanque com as autoridades e trocávamos a marcha batida para asteamento da bandeira, eu quase morria de emoção.... VC me fez reviver esses momentos com seu lindo texto. Obrigado por VC existir e ser nosso colega...👏🙏🏼

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