segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

ADEUS AO ZINHO



ADEUS AO ZINHO

A CADA ADEUS, PERCO UM POUCO DE MIM.

A última coisa que balbuciei tocando seus pés em seu último leito, foi um: Adeus meu irmão amado.

Amargurado até a última fibra de meu coração, humilhado nos meus conhecimentos médicos, pela segunda vez diante de um irmão que partia prematuramente sem que pudéssemos impedir, ou mesmo postergar o momento desse desenlace.

Tentando ainda uma última vez comunicar com seu corpo sem vida mas que também já não sofria mais; oramos, entoamos cantos de despedida, cânticos de louvores, orações pedindo a Deus amparo para sua alma e dizendo a você, uma última vez, o quanto o amávamos.

O pranto nos rostos que o cercavam naquele momento, os cuidados com que, principalmente sua esposa e filhos o cercaram, a vigília constante da família, as lágrimas contidas na sua presença e vertidas incontroladamente às escondidas pelo cuidado de não transmitir-lhe o quão desesperador era o seu caso. Tudo era expressão do quanto você era amado. Tudo era uma antevisão do grande vazio que você deixaria..

Adeus irmão, reencontre cada um do nossos, abrace cada um por mim, por nós. Fale comigo de alguma forma se for permitido. Aguce a minha fé que é pouca, confusa e instável.

Até quando foi possível procuramos, nos dois sempre expressar nosso afeto um pelo outro. Gostaria, agora é tarde, de que tivéssemos passado mais vida juntos; conversando, rindo; eu censurando o seu pouco juízo, no meu julgar, e você me chamando de trouxa por não saber aproveitar a vida e por ser facilmente tapeável pelas artimanhas que você montava para, em seguida, rirmos juntos.

Fazer alguém de trouxa, por mais que esse alguém estivesse com o pé atrás, era um rob seu, muito mais por diversão do que por qualquer maldade. Era uma espécie de jogo de inteligências. Servia mais para animar nossos encontros e darmos grandes risadas e vê-lo sorrir sacudindo o corpo, apontando o trouxa, que também caia na risada e avisava: vai ter troco.

Troco como, se você nunca baixava a guarda e quando parecia fazê-lo era só para dar corda para o adversário e ludibria-lo no último lance, apontando-lhe o indicador de uma mão robusta e dizendo: - Ou trouxa, as pessoas estão rindo é de você. Eu estava piscando o olho e fingindo que acreditava; estamos chorando de rir!...

Outro rob seu era dar conselhos sábios; escancarar as portas de sua casa, mesmo naqueles nossos tempos de extrema pobreza, aos seus irmãos, ao amigo em aperto, à mão estendida rogando.

A vida nos conduziu a seu bel capricho nesses sessenta e poucos anos. Nos contrapôs, nos uniu, nos separou e nos fez, inúmeras vezes, depender um do outro. Só nunca fez, foi que deixássemos de ser irmãos. Ficar-de-mal e de-bem, muitas vezes, ficamos, mas sem nunca romper o forte e indestrutível laço de amor fraterno que nos uniu e vai continuar a nos unir mesmo depois dessa sua partida.

Você partiu porque, na realidade, eu médico, não sei salvar vidas. Sei um pouco de minorar sofrimentos, de reparar lesões fáceis de corrigir; de dar apoio, de usar, com razoável correção, conhecimentos e drogas que outros pesquisaram. Sei um pouco de entender doenças para minimizá-las, para ajudar o organismo a vencê-las; para ajudar pessoas a conviver com algumas delas. Mas a vida escapa de nossas mãos esperada ou inesperadamente, por mais dedicação que se tenha, por mais que estudemos, por mais que combatamos nossa vaidade, por mais que suportemos o cansaço.

Admitindo essa outra dimensão onde as almas continuam a vida. Fico pensando se a vítima não seria aquele que aqui fica, chorando uma a uma as perdas de seus entes queridos e não, o que se vai.

Queira Deus que assim seja e que você agora possa correr sem se cansar, possa nos ver a todo momento e entender o que nos vai por dentro. Possa rir com seu alegre sorriso e nos fazer de trouxas por não podermos vê-lo, por nossa ganância que nos escraviza, por nossos medos inúteis, por desperdiçarmos momentos de convivência e não usufruirmos plenamente a alegria de poder estar juntos e de conviver.

Cada um, de nós está saudoso de sua presença, de sua risada, de seu saber, de chama-lo de peão e de poder abraça-lo sentindo sua mão pesada batendo em nossas costas.

A cada adeus perco um pedaço de mim, um pedaço de meu mundo se desfaz.

No último adeus, parafraseando Machado de Assis, disse a mim e a você; mais com o coração do que com a fala:

Ao pé do leito derradeiro,

Aqui venho Irmão querido,

Trazer-lhe o coração de companheiro

Por certo, quando nem mais um pedaço de meu ser, de meu universo puder ser tirado, então, Deus há de me dar esse direito de partir para encontra-los e então, Zinho, vamos usufruir de uma grande convivência, cheia de emoção, compreensão e alegrias e nosso convívio será eterno.

Sinto por não ter conseguido ser mais irmão, mais amigo, mais companheiro.

14/11/2010 - rilmar

                                                                                                          


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