segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

O Salvacionista Plastico



O Salvacionista Plástico





Na realidade, essa esperteza que se nota facilmente em mim, já estava presente desde quando minha mãe me deu à luz. (tsc... tsc)

Ainda nos primeiros momentos já fui usufruindo desse dom. Assim, no berçário, eu era o primeiro a receber a mamadeirinha; chuca. Embora todos os nenéns chorassem a plenos pulmões, eu acrescentava ao meu choro uns esperneios e umas bebidas de fôlego tais que a enfermeira não se continha, logo me pegava, me acalentava e ficava feliz ao me ver calminho, dando aquele sorrisinho agradecido e grudando na chuquinha de chá ou leite materno.

Pela vida afora continuei sendo sempre aquele pestinha do olho limpo, falado.

Zanzei pelo curso primário, meio perdido, meio alienado, mas feliz, brincando, jogando futebol, tendo umas apaixonites que logo se curavam pois não podiam ser mais que platônicas e sempre muito secretas. No ginasial me apertaram exigindo dedicação e mais disciplina e aí eu fui me descobrindo, percebendo meus caminhos.

O científico foi de descobertas de uns aspectos incríveis das ciências que explicavam tudo de fenômenos inexplicáveis até então para mim e que me cercavam e estavam por toda parte.

Veio o Vestibular: - Faturei firme... tsc... tsc... tsc.

Curso de medicina: - Moleza... tsc... tsc..

Escolha de especialidade: Parti para a Cirurgia Plástica.

Folgado na Residência, contando com ajuda financeira de meus pais, sempre presentes; aplicado; feliz; já adivinhando uma clientela bonita, saudável; financeiramente abonada.

A residência foi longa, trabalhosa, cansativa, extenuante mas incrivelmente rica em conhecimentos, treinamento e amadurecimento.

Formado, residenciado, cheio de planos; parti para o mundo.

Fui sempre me dando bem e fazendo o nome de cirurgião plástico inteligente, competente, dedicado, simpático, bem-falante e caprichoso. Os honorários eram muito satisfatórios e frequentes.

- Daí, veio a crise!...

Uma sequência de maus governos sucessivos, inconsequentes, despreparados, permissivos etc, etc. Resultou na chamada recessão. Recessão é terrível!

E, a clientela sumiu.

No hospital todo mundo coçava a cabeça e andava de um lado para o outro preocupados e fazendo cálculos e mais cálculos.

Todos os setores foram atingidos. Nem os doentes corriqueiros pareciam.

Até os partos escassearam.

A pediatria vazia, e os pediatras saudosos da barulheira infernal de crianças chorando, e das veias difíceis, e das fraldas molhadas, das fraldas cheias, dos vômitos, das eructações pós mamadas. Até as variações odoríficas da pediatria cheia estavam fazendo falta.

- A falência nos rondava.

Costumam lembrar de mim, em momentos tão difíceis assim. Quando a saída parece não existir. Vieram me procurar.

A coisa estava tão feia que também a plástica fora ferozmente afetada.

Pensei, pensei e, de repente; uma luz súbita clareou meu pensamento. Um insight mágico, oportuno e luminoso.

Vamos lançar a moda da mulher de três mamas!...

????...!!!! – Exclamaram.

Sem entender a princípio, sem saída e preocupadíssimos.

- Aceitaram.

Partimos para a luta. Ou seja, para a divulgação.

Programa do Faustão, Jô Soares à Meia-Noite, novela das oito, currículos escolares alardeando a liberdade de escolha, boca a boca, cartazes nos botecos, nas borracharias, nos postos de saúde; reunião com as famílias, conscientização, apelo para o politicamente correto e, mais e mais.

Passou o tempo, meses talvez, e o convencimento se tornou uma bolinha de neve impregnada de hormônio do crescimento. Deus, como que aprovou a ideia. Uma frente fria se fez presente com seus ventos gelados, os casais passaram a dormir mais cedo e agarradinhos, a terem novas fantasias e, não sei bem porque, a bolinha de neve cresceu.

Começaram a se formar filas nos consultórios de plástica.

Mulheres com silicone nas duas mamas vinham atrás da terceira mama, propiciando cirurgias e mais cirurgias pois não aceitavam argumentos contrários. Estavam conscientizadas. Era a moda. As Virgens de tratamento; ou seja, de silicone, já vinham querendo colocar nas duas mamas e preparar o local para o implante da terceira.

Os homens que já eram presas fáceis para as irresistíveis mulheres de duas mamas, passaram a investir alucinados nas de três.

A atração irresistível levou logo a um ganho na libido e ao consequente aumento da fertilidade de cá, e de lá. E toma de mulher engravidar e procurar ginecologistas para o pré-natal, e toma de partos e de neonatos necessitando pediatras. Com pouco mais de tempo, os consultórios dos pediatras se abarrotavam.

Tivemos, infelizmente, em pouco prazo, que aumentar os preços das cirurgias para terceira mama, para regular o consumo e aliviar ou pouco o setor de cirurgias plásticas.

Reprimir demanda é complicado e, às vezes, foge um pouco do controle. Então tivemos que calcar ainda mais a mão nos preços.

A prazo;

Parcelado;

A vista;

Com recibo;

Sem recibo;

Tivemos que aumentar o preço de tudo antes que o volume de procura afetasse a qualidade.

Também os outros setores do hospital tiveram que, provavelmente, adotar suas providências.

Acho que o resultado, a longo prazo, foi o equilíbrio, com satisfação geral de mulheres, maridos, amantes, namorados, das crianças que aos magotes passaram a brincar alegremente nas ruas; das avós que se enchiam, cada vez mais, de lindos netos; das madrinhas que batizavam até três bebês de uma mesma família.

Até a igreja, a medida em que aumentavam os batizados, parece ter gostado, pois abençoava abundantemente a ideia que virou projeto.

Falavam de alguns cientistas que eram contrários, mas não tinham ainda trabalhos

publicados.

Como os bebês mamavam, mamavam e mamavam; originou-se uma geração com incrível equilíbrio emocional e saúde imunológica invejável.

Graças à ideia da terceira mama, um mar de felicidade e alegre convivência nas ruas e nos lares, invadiu a região e vem se perseverando até nossos dias.

10/07/ 2017 - Rilmar

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