terça-feira, 30 de março de 2010

A Luz, A Cruz, Jesus

Réstia de luz
No horizonte;
Pende na cruz
Defronte;
Emana-lhe luz
Da fronte;
A luz, a cruz, Jesus
No monte!


Jesus na cruz no monte

Veio de longe para vê-lo. E prostrou-se diante da cruz em que Ele jazia dependurado. Quis erguer os olhos para embeber-se do seu semblante cheio de mansidão.
Mansidão que o homem não alcança, o filósofo vislumbra e o santo procura.
Inútil, não pôde!

Tudo ao redor emanava tristeza. Várias vezes tentou levantar o olhar em vão. Faltava-lhe coragem? Forças? Auto-domínio? Ou será talvez que se sentisse pequeno demais diante da magnificência do Cristo? Mas, o cordeiro de Deus na sua mansidão e humildade não poderia acaso ser contemplado de frente por um homem comum?

No ar e nas coisas pairava o tédio.
Pendente na cruz o filho de Deus.
Prostrado em frente um homem que andara muito. Que pernoitara muitas vezes ao relento. Que há muito não via os seus e que viera para vê-lo. A pouco e pouco foi vencendo a emoção e foi subindo vagarosamente o olhar. Viu seus pés descalços, feridos, edemaciados, riscados pelo sangue escorrido já ressecado. Depois olhou o corpo maltratado, as mãos feridas e por fim mirou-lhe a face. A face que deveria refletir a dor do escárnio, da traição, da ingratidão, da injustiça; a face que deveria estar contraída pela dor física; era calma. Irradiava compreensão, piedade até.

Pendia a cabeça de encontro ao peito como se Ele dormisse. Aflorava-lhe no semblante descontraído a impressão de que sonhava talvez com uma humanidade diferente, compreensiva, amorável, sincera, crente e desprendida.
Viera de longe suplicar-lhe cura. Mas, Ele jazia ali morto.
Não alcançando a cura física, sentiu que suas dores eram pequenas demais diante das dele.
Notou-se egoísta até.
Levantou-se.
Sentia-se leve. Descontraído.
Olhou mais uma vez para o Cristo e suplicou-lhe que o ajudasse no aprimoramento do íntimo. Para que a proximidade da morte e enchesse de esperanças. Para que a fé o enchesse de bondade durante a vida.

Virou-se e começou a afastar-se vagaroso. Olhou para a perna que uma úlcera comia e não conseguiu mais ficar triste. Deu alguns passos, desceu a perna da calça cobrindo a ferida e foi embora.
Andava lentamente, arrastando a perna inchada e ulcerada. A ferida era feia, antiga, profunda, cheirava mal e doía muito a cada passo. As pessoas o evitavam. A jornada pelo mundo parecia não ter fim.
Murmurava em prece, pleno de fé: Cordeiro de Deus, ainda que eu não mereça, derrama sobre mim e vossa paz. Alivia meu sofrer...
Num tempo de pouca medicina, de infindáveis caminhadas,sem afeto, vivendo da caridade, era grande súa pena.

A família

Tempos depois, anos talvez passados, percorria um estreito caminho que margeava uma cerca quando, parado à sua frente, viu o Cristo.
Tomé, talvez, não tenha visto um Cristo mais concreto e real.
Sentiu que estava diante de Jesus, não houve espanto, nem suplicou nada. Apenas o olhou e vendo que o Cristo sorria, sorriu também.
Depois se ajoelhou e pôs os olhos no chão. Nessa humílima atitude esteve imóvel por um tempo longo e emocionante..



Em certo momento, sentindo que Ele se fora, levantou-se.
O coração batia tão rápido e tão forte que parecia saltar do peito. Uma alegria esfuziante o arrebatava. Intrigado, desejoso de contar tudo a alguém, pôs-se a correr como um louco em direção ao povoado.
Deslocava-se velozmente, sem dores e sem se dar conta de que já podia correr.
Novembro de 1972.
Rilmar José Gomes